TERRA DE GELO, ROCHA E FOGO
segunda-feira, 17 de agosto de 2015
Publicação
Este conteúdo foi publicado no jornal O Popular (Goiânia-GO) em 17-08-2015 - link para o website do jornal
sexta-feira, 31 de julho de 2015
Uma semana no paraíso gelado
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Qualquer viajante, por mais experiente que seja, sente calafrios ao se aproximar da Islândia num avião da Icelandair. Trata-se de um país para poucos: são 320 mil habitantes esparramados em 103 mil quilômetros quadrados, humildade populacional que contrasta com a presença de dúzias de vulcões, geleiras infinitas, delicados fiordes, imponentes cachoeiras, estações de esqui, gêiseres, parques exuberantes e rica vida animal. Em suma, há de tudo num país que conta com pouco menos de um terço do território do estado de Goiás, por exemplo.
Qualquer viajante, por mais experiente que seja, sente calafrios ao se aproximar da Islândia num avião da Icelandair. Trata-se de um país para poucos: são 320 mil habitantes esparramados em 103 mil quilômetros quadrados, humildade populacional que contrasta com a presença de dúzias de vulcões, geleiras infinitas, delicados fiordes, imponentes cachoeiras, estações de esqui, gêiseres, parques exuberantes e rica vida animal. Em suma, há de tudo num país que conta com pouco menos de um terço do território do estado de Goiás, por exemplo.
A estrutura turística
do país não decepciona e conta com estradas em ótimo estado e hospedagem farta
e confortável, especialmente fora de temporada, e há linhas aéreas regulares que
o conectam com o restante do mundo. A melhor época de visita é a primavera, momento
em que a natureza pode ser observada em seu lento renascimento após os rigores
do inverno. Estivemos ali no mês de maio de 2015 e a temperatura média foi de
10 graus ao nível do mar. O verão é mais quente, mas atrai turistas em excesso.
Quanto aos meses de outubro a março, há o inconveniente das temperaturas muito
baixas, ainda que não tão extremas, mas é o período propício à visão mais
celestial do planeta Terra: a aurora boreal. Infelizmente, esta atração ficará
para a próxima visita.
As condições únicas do
país exigem um bom planejamento antes do embarque. É prudente pesquisar e anotar
as distâncias e o tempo disponível para cada atração, utilizando diversos sites
e mecanismos disponíveis na internet. Isto feito, optamos por alugar um carro e
circundar o país no decorrer de uma semana, reservando hotéis, albergues e
pousadas ainda no Brasil. As belezas do país são tantas que a semana se mostrou
curta e insuficiente. Para uma imersão mínima, um período de duas semanas é
recomendável, de preferência com um veículo à disposição, opção razoavelmente econômica
num país em que predominam os passeios fora das cidades.
A primeira impressão
que se tem do país, visto do alto do aeroporto de Keflavik, a 50 km da capital
Reykjavik, é a de uma terra inóspita. O solo é rochoso, formado por campos de
lava, e a aparência é a de um deserto incrustado na Lua. A Islândia é
vice-campeã mundial em atividade vulcânica do mundo, perdendo somente para o
Havaí, e o panorama faz justiça à honraria. As primeiras horas no país,
portanto, podem trazer sentimentos dúbios ao viajante, mas, aos poucos, já na
estrada, o espírito vai se desarmando e se acostumando com o panorama surreal.
Próxima ao aeroporto, a
primeira atração a ser visitada por nós seria a Blue Lagoon, a Lagoa Azul, um
parque formado por diversas piscinas com águas termais. Os islandeses são
afortunados com a abundância de fontes naturais de água quente, e cada pequena
cidade do interior possui uma ou mais piscinas públicas para o deleite dos locais.
A Lagoa Azul é o apogeu deste hábito nacional. Foram realizados grandes
investimentos que a tornaram conhecida no mundo inteiro, e tanto glamour lhe confere uma alma de resort, atraindo 400 mil visitantes
todos os anos. A água é azulada, quase branca, sulfurosa e rica em silício, e
surge em meio a muito vapor e espaço de sobra para os banhistas. O local é de
uma beleza singular e sua visitação é quase obrigatória.
Já relaxados pela água
quente e pelo visual do lugar, nos dirigimos ao hostel próximo (Start Keflavik) para uma noite merecida de
descanso. O dia seguinte seria dedicado a conhecer o local mais sagrado para o
orgulho do povo islandês: Thingvellir. Trata-se de um vale distante 50 km da
capital e é onde se localiza o Althingi, o primeiro parlamento do mundo,
fundado em 930. Além disto, a independência islandesa, então unida à Dinamarca,
foi proclamada neste lugar em 17 de junho de 1944, e o parque nacional que cerca
o vale foi proclamado Patrimônio da Humanidade pela UNESCO em 2004. A região abriga
o maior lago natural da Islândia, Thingvallavatn, de águas cristalinas, além de
cânions e fontes naturais. Por fim, pode-se caminhar no vão existente entre as placas
tectônicas que separam a América do Norte da Eurásia, as quais se distanciam
cerca de 2,5 cm por ano.
As atrações seguintes,
distantes pouco mais de 50 km, seriam a cratera Kerith, a área conhecida como
Geysir e a cachoeira Gulfoss. Antiga área de explosão vulcânica, Kerith convida
a uma passagem rápida, sendo que Geysir merece atenção. A região apresenta ao
viajante diversas fontes termais que jorram água fervente a grande altura, com
destaque para o brutal Strokkur, gêiser nervoso que “trabalha” de cinco em
cinco minutos. Um pouco além reina a estonteante cachoeira Gulfoss, a mais bela
da Islândia, um convite inescapável para a contemplação das forças da natureza em
versão hardcore. Estava finalizado o
chamado Círculo de Ouro e fomos nos abrigar numa confortável cabana na vila de Hella
(Cafe Arhus), na beira de um rio, com excelente comida e vinho no restaurante
local.
O terceiro dia na
Islândia foi dedicado às cachoeiras de Seljalandsfoss e Skogafoss, ambas
localizadas nas proximidades do venerável vulcão Eyjafjallajokull, o mesmo que
fechou o espaço aéreo da Europa com as erupções de 2010. Ambas as quedas são
plácidas e bucólicas, condizentes com a paisagem na estrada, e foram seguidas
pela visita às areias negras de Vik, a vila mais meridional do país, localizada
a 190 km da capital. Com sua costa recortada, convive perigosamente com os
humores do vulcão Katla. À noite, descanso na pousada Seljavellir Guesthouse,
na cidade de Hoefn, cidade pesqueira a oeste, com bela vista das montanhas.
O quarto dia foi
dedicado à navegação no lago glaciar Jökulsárlón.
Formado pelo derretimento de uma grande geleira, possibilita um passeio de
barco anfíbio entre icebergs azuis e focas pescadoras. O lago foi utilizado
para cenas de filmes como Batman Begins, Lara Croft e dois filmes do agente
007. Em seguida, visitamos o parque nacional Skaftafell, o qual abriga a
cachoeira Svartifoss e a geleira Vatnajökull, a maior da Europa em volume.
Recomendamos um dia inteiro no parque para caminhadas nas diversas trilhas
existentes, estruturadas em vários níveis de dificuldade. Na entrada, é
possível contratar um pacote para trekking
nas regiões mais afastadas da geleira, com equipamento apropriado, atividade de
dificuldade média.
No quinto dia, continuando a travessia do país, pegamos a estrada em
direção à cidade de Akureyri, a quarta maior do país com 17.000 habitantes,
localizada ao norte e muito próxima ao Círculo Polar Ártico. O caminho entre
Hoefn e Akureyri, de aproximadamente 450 km, envolveu a visão de uma costa
recortada e bastante cênica, a travessia de áreas montanhosas, a precipitação
de neve em plena primavera e a imagem das cachoeiras Godafoss e Detifoss, esta
considerada a maior da Europa. O ponto alto do trajeto foi o lago Myvatn,
grande porção de água nas bordas do irritado vulcão Krafla. A região conta com
um belíssimo parque nacional de rica fauna e uma usina geotérmica que produz
energia a partir do calor proveniente da Terra. Impressiona a caminhada no sopé
da montanha Námafjall, área conhecida
como Hverir, onde fumarolas e poços de lama fumegante são pura ficção
científica.
Após uma boa noite de descanso na pacata Akureyri, cheia de acolhedores
cafés e restaurantes tradicionais (experimente a cerveja regional Einstok),
seguimos novamente a estrada em direção à capital, completando, assim, o
roteiro ao redor do país. A singela Reykjavik é a capital mais setentrional do
mundo e, apesar da tranquilidade de suas casas coloridas e poucos edifícios,
tem vida pulsante e se orgulha de ser cosmopolita, diversa e tolerante. Locais
e turistas têm à disposição uma incrível gama de bares e restaurantes,
especialmente na charmosa rua Laugavegur, e em alguns deles é possível experimentar a famoso
prato hákarl, feito de carne de tubarão fermentada de 4 a 6
meses embaixo da terra. A iguaria vem em pequenos cubos e tem gosto de amônia.
Uma aguardente local feita de batata trouxe o paladar de volta à razão.
Na cidade, o viajante
tem a opção de embarcar para a observação de baleias e outros animais marinhos,
assim como pode visitar inúmeros museus dedicados à cultura islandesa ou ao
fenômeno da aurora boreal. Vale visitar a imponente igreja Hallgrímskirkja, ícone da cidade, cuja
construção durou de 1945 a 1986 e cujo design
remete a camadas de lava basáltica tão comuns no país. Ainda, vale mencionar a
bela construção denominada Harpa, uma sala de concertos à beira-mar que,
recentemente, foi palco de algumas cenas do seriado Sense8. O final da viagem à
Islândia foi comemorado no pub da premiada cervejaria dinamarquesa Mikkeller.
Deixamos o país com uma
impressão excelente de organização e limpeza, num ambiente de extremo cuidado
preservacionista. Prevaleceu a sensação de extrema hospitalidade e gentileza
dirigidas aos visitantes pela população local. A Islândia é um paraíso gelado
para os adoradores da natureza, pois há passeios para todas as faixas etárias,
com diversos níveis de dificuldade. A vida nas cidades é simples, mas animada,
particularmente nos meses mais quentes. Os custos com hospedagem e alimentação
não são baratos, mas a recompensa é incalculável. Os calafrios valeram a pena.
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